Mesmo após perder o foco em atrações internacionais e concentrar palestrantes brasileiros, a segunda edição do Web Summit Rio, conferência de tecnologia que aconteceu nesta semana na capital fluminense, decidiu priorizar palestras em inglês —e ouviu críticas de que isso tornava o evento excludente.
Um dos palestrantes —Guilherme Barbosa, CEO de uma startup voltada à ação climática— chegou a ser repreendido por falar português durante a apresentação. O mestre de cerimônias, também brasileiro, pediu, em inglês, para que Barbosa continuasse no idioma oficial do evento.
Questionada sobre o episódio pela reportagem, a produção do evento não respondeu até a publicação deste texto.
A organização, comandada por portugueses e irlandeses, optou por manter a preferência pelo uso do inglês nas palestras, ainda que tenha aberto algumas exceções. Os participantes da primeira edição já haviam reclamado da exclusividade do uso do inglês em território nacional.
Em sua segunda edição, o Web Summit Rio perdeu parte da cara de evento internacional e, ainda assim, atraiu recorde de público —mais de 34 mil pessoas.
As maiores atrações do evento neste ano vieram do Brasil: Luiza Trajano, do Magalu; Fábio Coelho, o CEO do Google Brasil; e Marcio Aguiar, que dirige a Nvidia na América Latina.
O foco do debate mudou das tendências tecnológicas desenvolvidas mundo afora, para as soluções adotadas no país. As empresas locais apresentaram suas estratégias de IA ou lançaram produtos como a nuvem do Magalu, Magalu Cloud.
Em agenda de expansão, o Web Summit conseguiu atrair mais nomes de projeção internacional à sua edição realizada em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, que teve executivos da Microsoft e da gigante dos chips Qualcomm.
Os maiores nomes internacionais no Rio estavam ligados ao mercado das criptomoedas e o chamado Web3 (blockchain), assunto que perdeu espaço em meio ao furor com IA após o sucesso do ChatGPT. Propriedade do fundador do Twitter, Jack Dorsey, a empresa de cripto Block enviou representantes ao evento.
No ambiente de negócios locais, porém, o blockchain ainda tem espaço, com a agenda de lançamentos da moeda digital do Banco Central, o Drex.
Empreendedores veem uma janela de oportunidade para desenvolver produtos financeiros com a tecnologia. Outro sinal da maior prioridade do Web Summit Rio à agenda econômica local foi o espaço dedicado à sustentabilidade. Empresas de energia como EDP, Eletrobras e Vibra expuseram em grandes estandes e dominaram um palco voltado ao tema. O principal assunto foram as fontes renováveis.
Para conversar com a pauta de tecnologia, houve apresentação de robôs que trabalham na manutenção das fontes de geração e palestras sobre as redes inteligentes que evitam o desperdício.
O presidente da BYD Brasil, Tyler Li, também apresentou os planos da empresa chinesa para aumentar o peso dos carros elétricos na malha veicular brasileira.
O dinamarquês Jens Nielsen, fundador da ONG World Climate Foundation que trabalha para influenciar as empresas a adotarem práticas mais sustentáveis, ficou responsável por mostrar que os conselhos de administração podem ganhar dinheiro e a simpatia do público caso optem pelo caminho do ESG.
Além do sucesso com o público, Web Summit repetiu o êxito com as empresas. Foram 175 parceiros, número superior ao ano passado.
No total, 1.066 startups apresentaram seus negócios a investidores. Algumas recebiam rodadas de investimento ali mesmo, nos pavilhões do Riocenter.
O evento organiza uma competição de qual delas oferece a melhor proposta de produto, o chamado “pitch”. Ganhou a carioca deco.cx, uma plataforma baseada em IA para facilitar a construção de sites. O CEO do startup, Guilherme Rodrigues, afirmou que a vitória sobre uma concorrente canadense mostrava as condições das empresas brasileiras competirem no cenário global.
As startups participantes mostraram produtos diversos: de um cachorro robô, passando por um totem capaz de examinar pacientes a partir de uma câmera, a uma IA especializada no português dos brasileiros.
O Web Summit Rio também destacou a presença feminina, que representou 45% dos fundadores de startups. O Banco do Brasil manteve um palco com palestras focadas em incentivar as mulheres a empreender.
O evento também serviu de amostra da corrida dos países para atrair talentos de tecnologia. Na abertura, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), disse que a cidade estava de portas abertas para os nômades digitais.
Representantes de Finlândia, Alemanha, Suíça e Portugal, por outro lado, tentavam atrair os brasileiros com formação técnica para diversas áreas. “Nós temos profissionais com excelente educação na Finlândia, mas nossa população é pequena, precisamos de mais”, afirmou Heidi Kuusamo, do Work in Finland (trabalhe na Finlândia).
O repórter viajou a convite do Web Summit Rio