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Não há competição entre bebês e IA – 09/02/2024 – Tec

Enfrentando um bebê gritando e jogando comida no chão, pais estressados podem se surpreender ao ouvir que sua amada criação provavelmente é o aprendiz mais inteligente do universo.

Mas alguns cientistas da computação reconhecem há muito tempo essa realidade e agora estão tentando imitar os poderes de processamento extraordinários dos bebês para desenvolver modelos de inteligência artificial (IA).

Em alguns aspectos, nossas criações tecnológicas mais recentes parecem quase mágicas em suas capacidades, mas quando se trata de aprendizado autônomo, elas são tão burras quanto uma fralda.

Poderiam essas tecnologias ser treinadas para aprender como unidades de processamento de bebês, explorando dados parciais, confusos e do mundo real?

Uma equipe de pesquisadores da NYU (Universidade de Nova York) tem tentado fazer exatamente isso e neste mês publicou suas descobertas na revista Science.

O experimento coletou dados de uma câmera leve presa à cabeça de um bebê em Adelaide chamado Sam, registrando 61 horas de sua vida dos 6 aos 25 meses.

O fluxo de vídeo, incluindo imagens e sons embaralhados de pais, gatos, brincadeiras e brinquedos, foi então processado em 600 mil quadros de vídeo e 37.500 “enunciados” transcritos e alimentados em uma rede neural.

O desafio era combinar o que Sam via durante aproximadamente 1% de suas horas acordado com os sons que ele ouvia, para criar um modelo de IA multimodal.

Mas como um bebê entende que a palavra “bola” se relaciona com objetos redondos, saltitantes e multicoloridos muito diferentes?

Os cientistas cognitivos estão divididos sobre a explicação, mas todos concordam que os bebês são aprendizes incrivelmente habilidosos, generalizando a partir de entradas limitadas.

Entre seis e nove meses, os bebês começam a conectar palavras a imagens. Antes dos dois anos, eles já aprenderam em média 300 palavras, principalmente substantivos.

Até agora, as tentativas de construir modelos de IA multimodais que possam combinar texto, imagens, áudio e vídeo têm dependido principalmente da aplicação de enorme poder computacional a vastas quantidades de dados selecionados.

Mas os pesquisadores da NYU descobriram que seu modelo poderia associar com sucesso imagens e sons com substancialmente menos dados provenientes do vídeo de um bebê. Seu modelo teve uma taxa de precisão de 61,6% ao classificar 22 “conceitos visuais”.

“Ficamos muito surpresos que o modelo pudesse exibir um grau bastante notável de aprendizado dado os dados limitados que ele tinha”, disse Wai Keen Vong, autor principal do artigo da NYU, em uma entrevista em vídeo.

Essas descobertas são um incentivo encorajador para o desenvolvimento de futuros modelos de IA. Mas, como observa Vong, elas também destacam as habilidades de aprendizado fenomenais dos próprios bebês, que podem responder a sinais visuais e desenvolver suas próprias hipóteses de aprendizado.

Parte da razão para sua precocidade é que os bebês humanos passam um longo período explorando ativamente o mundo antes de terem que se virar sozinhos.

“As crianças são o departamento de P&D [pesquisa e desenvolvimento] da espécie humana —os caras do céu azul, os criadores de ideias. Os adultos são produção e marketing”, como Alison Gopnik escreveu de forma memorável em seu livro “O Bebê Filosófico”.

De acordo com Gopnik, professora de psicologia na Universidade da Califórnia em Berkeley, os bebês têm três habilidades principais que os sistemas de IA não têm.

Primeiro, os bebês se destacam na construção imaginativa de modelos, criando uma estrutura conceitual para explicar o mundo. Eles também são curiosos, amantes de aventuras e aprendizes incorporados, explorando ativamente novos ambientes, em vez de estarem passivamente envolvidos em linhas de código.

E os bebês são animais sociais, aprendendo com todos com quem interagem, ajudando a desenvolver empatia, altruísmo e uma sensibilidade moral.

Em um email, Gopnik diz que o estudo da NYU é “fascinante e muito inteligente” e mostra que os modelos de IA podem extrair informações linguísticas dos dados com os quais os bebês lidam.

Mas, como os próprios autores do artigo reconhecem, os bebês também usam dados diferentes, que obtêm por meio de exploração ativa e interação social.

“O sucesso dos modelos, que ainda é muito limitado, pode aproveitar as capacidades de exploração e aprendizado social dos bebês, mas isso não significa que eles próprios tenham essas habilidades”, escreve Gopnik.

Será necessário muito mais pesquisa para replicar computacionalmente o que os bebês aprendem naturalmente. Em particular, como podemos construir máquinas que demonstrem senso comum e raciocínio social?

Os modelos de IA podem ser capazes de aprender substantivos associados a objetos físicos, mas ainda têm dificuldade com conceitos abstratos e verbos. Apesar dos avanços impressionantes em IA, ainda temos muito a aprender com o pequeno conjunto de “hardware” biológico que é o cérebro de um bebê.

Visto primeiro na Folha de São Paulo

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