Altman diz que tem trabalho mais importante da história – 10/05/2025 – Tec

O refúgio de Sam Altman do Vale do Silício é uma fazenda espaçosa no final de uma estrada que serpenteia pelas colinas cobertas de vinhedos no Vale de Napa, ao norte de San Francisco, na Califórnia.

Para um almoço com o Financial Times, o homem por trás do ChatGPT ofereceu-se para cozinhar uma refeição vegetariana simples em sua fazenda em vez de me encontrar em um restaurante de sua escolha, onde provavelmente seria perseguido por caçadores de selfies.

Desde que a OpenAI, empresa que ele dirige, lançou o modelo de inteligência artificial generativa em 2022, Altman foi catapultado ao status de celebridade mundial. No ano passado, casou-se com seu então namorado, um engenheiro de software, e recentemente tiveram um bebê por meio de barriga de aluguel, então ele tem passado mais tempo na fazenda em Napa.

Ele transformou a OpenAI em uma das empresas de crescimento mais rápido de todos os tempos, com uma avaliação impressionante de mais de US$ 250 bilhões, e acelerou uma feroz corrida pela supremacia da IA —a busca pela inteligência artificial geral, quando uma máquina pode superar as habilidades cognitivas humanas, não apenas absorvendo conhecimento, mas raciocinando e aprendendo por conta própria.

Mas tem sido uma jornada com altos e baixos na qual Altman foi demitido e recontratado, e seu compromisso com o desenvolvimento seguro da IA foi alvo de questões contundentes. Ele disputou com Elon Musk, com quem cofundou a OpenAI, e discutiu com Scarlett Johansson, que o acusou de usar uma voz “estranhamente semelhante” à dela para treinar um chatbot.

Tendo superado concorrentes mais estabelecidos, principalmente o Google, ele foi cortejado por presidentes e primeiros-ministros e seduziu alguns dos maiores investidores do mundo.

Nossa conversa vai desde produtos de IA até a questão existencial de um futuro com IA para o qual um punhado de tecnólogos otimistas está nos conduzindo firmemente, gostemos ou não. Irradiando ambição, ele soa como um homem convencido de seu próprio destino.

Ele me diz que tem o “trabalho mais legal e talvez mais importante da história” e, embora costumasse pensar que a IA fosse tão transformadora quanto a Revolução Industrial, agora considera que a “explosão de criatividade” faz do Renascimento uma analogia mais adequada.

Nos encontramos logo após o lançamento do o3 da OpenAI, um modelo de IA mais avançado com capacidade aprimorada de raciocínio e geração de imagens. É, segundo ele, um passo importante para a criação de agentes de IA que podem executar tarefas em nome dos humanos, e dos quais estão atrás todas as principais empresas. “As pessoas estão dizendo que isso é uma inteligência de nível genial”, ele se entusiasma.

Assim que a ferramenta foi lançada, os usuários inundaram a internet com imagens geradas no estilo do estúdio de animação japonês Studio Ghibli. Isso deu a Altman e à OpenAI um impulso de marketing sensacional, mas renovou questões sobre o uso da propriedade intelectual de outros para treinar modelos de IA e gerar arte.

Altman diz que a compensação para artistas pode ser necessária (sua empresa fez acordos de licenciamento com publishers, incluindo o FT), mas prefere colocar as ferramentas no mundo e depois encontrar respostas para as questões que surgem.

“Há algumas pessoas que dizem ‘toda arte de IA é terrível’, mas há muitos artistas que dizem ‘esta é a melhor ferramenta de todos os tempos, é como a invenção da câmera'”, diz Altman. “Concordamos que precisamos de um novo modelo de negócios para este tipo de mundo, mas qual é ele, a comunidade ainda está meio que tateando. Sei que precisamos convergir para o que deveria ser.”

Enquanto conversamos, procuro pistas em sua criação que indiquem seu futuro estrelato. Ele diz que não há nenhuma. “Eu era como um garoto judeu meio nerd no Meio-Oeste… então tecnologia simplesmente não era uma coisa. Tipo, gostar de computadores era meio que incomum. E certamente nunca poderia ter imaginado que acabaria trabalhando nessa tecnologia desse jeito. Ainda me parece meio surreal que isso tenha acontecido.”


Table of Contents

Fazenda de Sam Altman no Vale do Napa, Califórnia

  • Massa com pimentas, alho, nozes, salsa e pecorino
  • Cenouras assadas
  • Salada de folhas com cenouras e rabanetes
  • Café espresso
  • Chá

O mais velho dos quatro filhos de uma mãe dermatologista e um pai que trabalhava com imóveis, Altman lia muitos livros de ficção científica, assistia “Star Trek” e gostava de computadores. Em 2005, abandonou a Universidade de Stanford antes de se formar para lançar uma startup de rede social. Naquela época, a IA ainda estava em sua infância: “Podíamos mostrar a um sistema mil imagens de gatos e mil imagens de cachorros, e então a IA podia classificá-los corretamente, e isso era o auge.”

Logo, Altman estava dirigindo a Y Combinator, uma aceleradora de startups que havia apoiado seu primeiro empreendimento. Ele ainda estava lá quando iniciou a OpenAI em 2015 como uma organização sem fins lucrativos com a missão de que a inteligência artificial geral deveria beneficiar toda a humanidade.

Musk foi um cofundador que a financiou com dezenas de milhões de dólares, mas depois se desentendeu com Altman e deixou seu conselho em 2018 em uma das disputas mais observadas do Vale do Silício.

Musk, que tem desenvolvido sua própria empresa rival de IA, a xAI, alega em um processo que Altman se desviou da missão fundadora da empresa. Altman entrou com um outro processo. “Parece claro para mim por que ele está fazendo tudo isso”, disse. “Porque ele está tentando atrasar um concorrente e não gosta que não esteja vencendo em IA.”

Musk pode ter seus motivos pessoais, mas o debate sobre como “vencer” em IA —que requer poder computacional e investimento massivos— sem afrouxar o compromisso com a segurança, há muito divide a OpenAI.

As disputas estouraram em público em novembro de 2023, quando o conselho sem fins lucrativos demitiu Altman repentinamente, com um membro do conselho acusando-o de deturpar informações e, em alguns casos, mentir para o conselho. Ele saiu ganhando.

Altman foi reintegrado em poucos dias, depois que quase todos os funcionários ameaçaram se demitir e a Microsoft, então o maior apoiador financeiro da empresa, ofereceu-se para contratar Altman e sua equipe.

“Foi muito doloroso e muito embaraçoso que tudo isso acontecesse, e ninguém, incluindo eu, realmente sabia tudo na época. O que eu queria era ir sentar em uma praia e me recuperar, mas tive que continuar dirigindo a empresa e limpar uma bagunça gigantesca.” Essa bagunça, disse ele, incluía clientes e investidores perguntando se poderiam confiar na empresa.

A tempestade levou à saída de alguns dos melhores pesquisadores da OpenAI e deixou questões persistentes sobre Altman. Mas também cimentou seu status como líder indiscutível da empresa, com um novo conselho que o apoia.

Suas ambições também se expandiram: no início deste ano, ele estrelou outro evento que chamou a atenção, aparecendo na Casa Branca com Donald Trump para anunciar uma joint venture com o SoftBank que arrecadará centenas de bilhões de dólares para desenvolver infraestrutura de IA, incluindo centros de dados.

Mas as tentativas de mudar a estrutura da empresa para um negócio com fins lucrativos mais tradicional encontraram resistência, tanto de Musk quanto de especialistas em IA, que insistem que a empresa deve permanecer sob um conselho sem fins lucrativos para cumprir sua missão inicial.

Pergunto a Altman se ele aprendeu com a tentativa de golpe. Tudo o que ele admite é que prefere evitar conflitos e teve que aprender rapidamente como administrar uma empresa tão complexa. “Nos últimos dois anos, passamos por uma década e meia do crescimento de uma empresa normal.”

Como um grande disruptor hiperativo nas redes sociais e, segundo ele mesmo, a “divisão de marketing” da OpenAI, ele gera um fluxo constante de notícias. Recentemente, isso incluiu uma disputa com uma irmã afastada que o acusou de abuso sexual quando ela era criança (o resto da família apoiou suas negações e ele diz sentir tanto compaixão quanto tristeza por uma irmã que “tem passado por dificuldades há muito tempo”).

Altman afirma que ser competitivo não é uma de suas características definidoras, mas ele se delicia com conversas sobre vencer. Ele admite que já considerou concorrer a governador da Califórnia (não uma candidatura presidencial, como alguns afirmaram); sua maneira favorita de descrever o alcance do ChatGPT não é 800 milhões de usuários, mas “10% do mundo”.

Mas até que ponto a corrida competitiva realmente importa? Enquanto o Vale do Silício tem feito investimentos massivos em IA, a DeepSeek, uma startup chinesa, lançou um modelo neste ano desenvolvido com orçamento limitado. Isso sugeriu que os modelos de IA estavam se tornando commodities e a vantagem tecnológica dos EUA sobre a China estava diminuindo.

Altman diz que há um “asterisco” na narrativa da commoditização: “A maioria desses modelos será commoditizada. Os modelos de fronteira, eu não acho que serão.” Ele está, é claro, esperando prevalecer nos modelos de fronteira, mas também vencer no jogo da commoditização, dado quantos usuários já estão conectados ao ChatGPT.

E como a OpenAI entregará os retornos sobre o investimento massivo? Altman insinua seu objetivo final, mas o descreve como apenas uma ideia convincente: quando uma assinatura do ChatGPT se tornar uma IA pessoal, através da qual os usuários acessam outros serviços. “Você poderia simplesmente levar sua IA, que vai conhecê-lo melhor ao longo da sua vida, ter seus dados e ser mais personalizada, e usá-la em qualquer lugar. Essa seria uma plataforma muito legal para oferecer.”

O progresso da IA está avançando em uma velocidade tão impressionante que alguns especialistas defendem uma desaceleração até que normas e regulamentos internacionalmente acordados sejam implementados.

Há dois anos, o próprio Altman assinou uma declaração com outros da área alertando que “mitigar o risco de extinção pela IA deveria ser uma prioridade global junto com outros riscos de escala social como pandemias e guerra nuclear”.

Altman insiste que não mudou de ideia e que haverá momentos em que conter-se pode ser necessário. Por enquanto, ele parece satisfeito com o lançamento de ferramentas para que as pessoas experimentem e avaliem os riscos. “O mundo precisa saber sobre isso [IA], o mundo precisa opinar sobre isso, muito intensamente. Nossos usuários nos ajudam a decidir quais devem ser os limites, como aprender essa função de valor coletivo e as preferências da humanidade”, disse.

Alguns avanços realmente o assustam. Depois de lançar um recurso de memória que permite à IA registrar comportamentos passados, ele ouviu casos em que os usuários se tornam emocionalmente dependentes demais da IA. “As pessoas dizem, este é meu novo melhor amigo, você nunca pode excluir esta versão, eu preciso dessa coisa… Não tenho dúvida de que nós, a sociedade, descobriremos como navegar nisso, mas isso é uma coisa nova que acabou de acontecer e você pode imaginar todo tipo de maneiras como isso pode dar muito errado.”

Mais alarmante, observo, é um futuro em que agentes de IA se comunicam entre si sem instruções de humanos. Altman explica que talvez não seja um agente que cria outros agentes, mas um sistema de IA tão bom, tão confiável, que efetivamente controla o que os humanos fazem. “Ele [o modelo de IA] se torna simplesmente melhor do que conseguimos conceber.” Isso soa tão assustador que até ele parece alarmado com suas próprias palavras.

Altman não me parece um homem que alimenta dúvidas, mas pergunto como seu grande plano de construir um gigante da IA poderia dar errado. Ele está confiante de que a OpenAI existirá em 10 anos? “Consertar cercas e cuidar de vacas” seria seu plano B, brinca. Mais seriamente, ele diz: “Poderíamos fazer uma aposta errada em pesquisa, poderíamos ficar atrás em produto. É como se estivéssemos fazendo uma coisa muito complicada.”

Estamos conversando há mais de duas horas e seu marido, segurando o bebê, se junta a nós na sala de estar, e depois de alguma agitação, o pequeno bebê está adormecendo. Pergunto se Altman acha seu admirável mundo novo, no qual os humanos não são a coisa mais inteligente do planeta, ameaçador —se não para ele, então para seu filho?

Ele está, previsivelmente, muito fascinado por sua criação de IA para sentir ameaça. “Você acha que é mais inteligente que o o3 agora? Eu não, e me sinto completamente tranquilo, e aposto que você também”, diz ele. “Estou abraçando meu bebê, aproveitando meu chá. Vou fazer um trabalho muito empolgante a tarde toda. Vou usar o o3 para fazer um trabalho melhor do que eu conseguia fazer um mês atrás. Vou caminhar hoje à noite. Acho ótimo. Sou mais capaz. Meu filho será mais capaz do que qualquer um de nós pode imaginar.”

Visto primeiro na Folha de São Paulo

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