À espera da volta do Pronampe, incerteza aumenta cautela de empresários na tomada de crédito
Segundo o Sebrae, três a cada quatro pequenos negócios retomarão o faturamento até outubro, mas isolamento em queda e vacinação lenta jogam dúvida sobre uma possível terceira onda da Covid-19; especialistas consultados pelo G1 comentam se vale a pena partir para o crédito. A chegada da pandemia da Covid-19 pegou as sócias do Barziin Gastrobar no auge do sucesso. Com público crescente, o mês de fevereiro de 2020 trouxe o maior faturamento do bar de Brasília desde sua inauguração, em abril de 2019.
O primeiro fechamento do comércio para contenção do vírus no Distrito Federal, em março do ano passado, encontrou o grupo ainda sem dívidas – um privilégio na disputa por crédito em meio à crise. Apelaram ao Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) e o crédito foi concedido.
“Com o bar em crescimento, tínhamos reinvestido o que faturamos. A cidade fechou completamente e a liberação demorou bastante. Quando o dinheiro chegou, nossa dívida era enorme”, diz Luara Corrêa, sócia do Barziin.
As sócias do Barziin: Marcella Melo e Iraguaci Cordeiro (cima), Daphinie Torquato e Luara Corrêa
Divulgação
Toda a primeira remessa do Pronampe serviu apenas para quitar dívidas passadas. Foi necessário requisitar ajuda ao programa local de crédito emergencial do Distrito Federal, chamado Supera DF. Ao mesmo tempo, as sócias recorreram ao programa de preservação de empregos (BEm) para reduzir os custos fixos com salários.
Segundo Luara, a combinação do reforço de caixa e diminuição dos custos foi suficiente para fechar 2020 com o bar vivo. Mas veio a segunda onda da Covid-19.
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Simultaneamente, parcelas do Pronampe e do Supera DF começaram a vencer e funcionários retornaram de suas jornadas reduzidas. Um novo fechamento do comércio foi determinado e não havia mais programas emergenciais de auxílio.
“O governo não ajudou e entramos em um estado muito crítico. Todas as sócias ficaram negativadas, então não temos mais acesso a crédito. Se houver mais uma restrição ao comércio, teremos que fechar”, diz Luara.
Para a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), o caso do Barziin é apenas um entre tantos exemplos parecidos. Em levantamento, a entidade mostra que 76% dos estabelecimentos têm dívidas em atraso. Ao Pronampe, linha com taxas mais baixas, apenas 41% dizem que conseguiram acesso. E, pior, 80% não conseguiram extensão dos prazos de pagamento.
“O que parece positivo é que o novo Pronampe vem agora com 20% reservado às empresas mais atingidas do turismo, o que ajuda nosso setor. Mas deveria ter sido renovado com muito mais celeridade”, diz Paulo Solmucci, presidente-executivo da Abrasel.
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Retorno tardio
O período de paralisação dos programas de apoio às empresas e a falta de incentivos fiscais no início de 2021 foram amplamente criticados também por outras associações de comerciantes. Com o iminente colapso do sistema de saúde por conta da segunda onda da Covid-19, foi preciso restringir mais uma vez a circulação de pessoas e o setor queria compensações mais cedo.
Auxílio Emergencial, para melhora do consumo, e o BEm, para reequilibrar contas fixas das empresas, foram reinstalados, faltando apenas a política de crédito facilitado.
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Foi necessário um novo projeto que partiu do Senado para buscar tornar o programa permanente e estabelecer novas regras, incluindo aumento da taxa de juros. No último dia 11 de maio, o Congresso terminou a fase de tramitação e enviou o programa para aprovação presidencial. Até o momento, no entanto, o presidente Jair Bolsonaro não sancionou a legislação.
A insegurança com os rumos da pandemia acende o alerta de empreendedores que precisam de reforço para continuar de portas abertas. Enquanto procuram reforço de caixa para voltar a operar com vigor, infectologistas não descartam uma terceira onda de Covid dado o cenário de vacinação lenta e isolamento social em queda.
Carlos Melles, presidente do Sebrae: entidade estima retorno de faturamento de 73% das empresas até outubro – se a vacinação for bem.
Charles Damasceno/Sebrae
Mas há quem esteja otimista. O Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) estima que 73% das pequenas e médias empresas terão retomado o faturamento equivalente ao período pré-pandemia até o início de outubro.
Isso significa um universo de 12,5 milhões de pequenos negócios que podem retomar o nível de atividade do início de 2020. Mas há uma condição: vacinação de todos os adultos acima dos 25 anos até 5 de outubro, como prevê o calendário do Ministério da Saúde.
“As pessoas estão muito ávidas para passear, consumir e conviver. Com boa parcela da população vacinada, haverá alta muito forte do faturamento e o momento será de oportunidade”, diz Carlos Melles, presidente do Sebrae.
A ressalva de Melles fica para negócios que podem ser impactados de forma mais intensa por mudanças de comportamento da população que vieram para ficar.
Um exemplo é o efeito da maior adoção do home office, que pode diminuir a circulação em polos empresariais. Prestadores de serviços em regiões como essa podem apenas não reaver o nível de atividade a que estavam habituados.
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Crédito compensa?
Para especialistas consultados pelo G1, o possível retorno do Pronampe é ótima notícia, mesmo com taxas de juros mais altas que na edição passada. O reajuste, contudo, aperta ainda mais as contas de empresas que já passam por dificuldades e pode tornar-se proibitivo pelo custo a longo prazo.
O professor de administração da FEA-USP Paulo Feldmann prefere a precaução e afirma que o ideal é que os empresários façam uma boa estimativa de caixa futuro para que fiquem claras as entradas e saídas por seis meses, no mínimo.
“O segundo semestre ainda deve ser complicado. A melhor alternativa é negociar de saída para que, se for possível, as parcelas comecem apenas em 2022”, afirma Feldmann.
O professor acredita que o retorno forte de países em que a Covid está controlada, como Estados Unidos, Israel e Reino Unido, pode ser replicado no Brasil. O alongamento sugerido é, justamente, para anular o atraso de vacinação e aproveitar a retomada, considerando uma hipótese mais pessimista de chegada de doses.
“Houve uma queda relevante de renda neste ano, mas uma saída segura da crise, por meio de vacinas, aumentará o investimento e as contratações. É mais renda distribuída pelo trabalho e nova injeção no consumo”, diz.
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Já Sérgio Lazzarini, professor de administração do Insper, entende que o Brasil perdeu a oportunidade de um desgaste muito menor dos negócios por falta de coordenação.
Para ele, os programas de crédito deveriam estar preparados para liberação conforme as necessidades de fechamento do comércio para reduzir a curva de contágios pela Covid. A ação seria conjunta entre entes federais, estaduais, municipais e instituições financeiras.
“Seria possível levar o isolamento social ao máximo, reverter a curva de contágios e dar resgate ao empresário com o devido planejamento de como e quando será reaberta a economia”, diz Lazzarini.
Segundo ele, caberia a um gabinete interministerial de crise centralizar as ações em âmbito federal, com comunicação direta com os demais entes federativos. Sem a articulação conjunta, porém, o empresariado como um todo foi obrigado a queimar o caixa além do necessário, com suporte de crédito que demorou a chegar – quando veio.
“Os empresários não podem ter uma visão míope de só exigir reabertura. Tem que entender o motivo do fechamento do comércio e exigir ajuda para esse momento”, afirma.
A incerteza de que dias melhores vêm pela frente é justamente o que ameaça outros 50 mil bares e restaurantes de fechar as portas em 2021, segundo a Abrasel. Sem um cenário melhor, um deles pode ser o Barziin Gastrobar.
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