Startups brasileiras lideradas por negros são selecionadas para fundo de investimento do Google
Gigante da tecnologia não pede participação na empresa ou retorno financeiro, mas tem expectativa no crescimento para que se tornem clientes de seus produtos. Fachada do Google.
Jeff Chiu/AP
O Google anunciou nesta terça-feira (13) oito novas startups selecionadas para receber investimentos do Black Founders Fund.
A gigante da tecnologia anunciou em setembro passado que investiria R$ 5 milhões em negócios geridos por negros no Brasil a partir do seu braço Google for Startups, ampliando uma iniciativa que nasceu nos Estados Unidos em junho de 2020.
Além do aporte financeiro, o projeto oferece mentoria para as startups que ajuda em decisões como escolha de tecnologias, construção de canais de venda e como captar mais investimentos.
Com esse anúncio, o total de empresas selecionadas para o Black Founders Fund desde o seu lançamento, em setembro de 2020, chega a 17. Das oito novas empresas selecionadas, quatro vêm de estados do Nordeste (veja a lista completa mais abaixo).
A expectativa do Google for Startups Brasil é realizar cerca de 30 aportes até o fim de 2021. As inscrições e os investimentos começaram em setembro passado e novos cadastros podem ser feitos através do site da iniciativa.
Foco em minorias
Segundo André Barrence, diretor do Google for Startups na América Latina, o fundo surgiu em meio a discussões sobre raça no Brasil e nos EUA, principalmente depois da onda de manifestações que ocorreram após a morte de George Floyd.
O segurança negro foi morto em 25 de maio após ser imobilizado por um policial branco com um joelho em seu pescoço.
“Ainda não existem dados o suficiente para entender o tamanho da dificuldades dos empreendedores negros no Brasil, mas olhando para os nossos dados, percebemos que esse é um problema concreto”, disse Barrence.
“Empresas lideradas por brancos captaram 69 vezes mais recursos do que as startups geridas por não brancos, como pretos, indígenas e amarelos”, afirmou, citando um levantamento feito com membros da iniciativa do Google.
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Por que investir?
Os valores destinados para cada negócio dependem das necessidades de cada empresa, estágio do produto oferecido e de possíveis investimentos passados. O Google não pede participação na startup ou retorno financeiro em seus fundos, sejam do Black Founders Fund ou outras iniciativas.
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Questionado sobre as vantagens do investimento para o Google, Barrence disse ao G1 que a companhia quer promover a diversidade e inclusão no ecossistemas de startups e que o crescimento das empresas pode gerar frutos para a gigante da tecnologia.
“Acreditamos que, se fizermos um bom trabalho, formos parceiros e essas companhias crescerem, em algum momento se tornarão potenciais parceiros e clientes de produtos do Google”, afirmou o diretor.
“Temos muitos produtos que podem ajudar os empreendedores. Esse retorno pode acontecer, mas o foco é social e de diversidade”, completou.
Startups selecionadas
As 8 novas startups selecionadas são:
AfroSaúde: oferece soluções tecnológicas em serviços de saúde para a comunidade negra;
Certdox: plataforma de simplificação e aceleração do processo de contratação de crédito;
Diáspora.Black: reúne ofertas de turismo, hospedagens, cursos e experiências que valorizam a história e a cultura afro;
Gestar: conecta profissionais da saúde materno infantil a famílias;
Inventivos: plataforma de educação e networking em comunidade com micro-formações para criativos, ativistas e empreendedores;
Prol Educa: plataforma de oferta de vagas que não foram preenchidas nas matrículas das instituições de ensino privadas por um valor mais acessível;
Trakto: ferramenta online de edição e produção de artes para redes sociais, sites, e outras peças de marketing digital;
UnicaInstancia: plataforma de mediação online que usa dados para adiantar indenizações de empresas de serviços, como telefone e luz, com objetivo de democratizar o acesso ao Direito do Consumidor.
Nove startups já fazem parte do programa Black Founders Fund:
Afropolitan: oferece um e-commerce que reúne produtos e marcas de empreendedores negros;
AOCA Game Lab: um estúdio de desenvolvimento de games, responsável pelo jogo Árida;
Creator: plataforma que conecta profissionais criativos autônomos a empresas que precisam de seus serviços;
Easyjur: software jurídico para controle de prazos e gestão de escritórios de advocacia e empresas com departamento jurídico;
Leg Aut: busca, organização e análise de documentos da operação para transações imobiliárias;
TrazFavela: aplicativo de delivery com foco no comércio local e que atende as áreas periféricas de Salvador;
Treinus: oferece um sistema para prescrição de treinos esportivos;
Wellbe: plataforma de gestão de saúde baseada em inteligência de dados, tem o objetivo de auxiliar empresas a reduzirem custos com planos de saúde;
Weuse: uma plataforma de aluguel de roupas para o dia a dia com um plano mensal.
Como é feita a escolha?
As startups precisam ter uma solução com base em tecnologia e pelo menos alguns usuários para concorrer ao investimento do Google for Startups.
Com base nas inscrições e em indicações, o braço de investimentos da empresa analisa alguns critérios:
quais companhias são mesmo startups, que oferecem soluções com base em tecnologia;
estágio atual da empresa, se já tem um produto pronto e usuários;
potencial de crescimento;
se procuram investimentos em estágio seed (o primeiro investimento, que também pode ser realizado após o aporte de um investidor anjo).
“Criamos uma lista curta de empresas que são entrevistadas por um comitê com pessoas de diferentes áreas ligadas ao Google para entender qual é o momento daquela startup e o que conseguimos ajudar além do dinheiro. Nos respaldamos muito nos funcionários negros do Google para essa escolha”, comentou Barrence.
Paulo Tenório, cofundador da plataforma de design Trakto, contou ao G1 que, antes de ser selecionado para o fundo, já tinha participado de um processo de aceleração do Google, que não envolvia capital.
“O processo de seleção envolveu ligações por vídeo com o time do Google, foram vários papos para entender o estágio da empresa e o que queríamos fazer daqui pra frente”, contou.
A Trakto fatura anualmente R$ 1,5 milhão, tem 24 funcionários e cerca de 50 mil clientes ativos. Tenório disse que a base de usuários aumentou 40% desde que recebeu o investimento.
“Uma quantidade muito pequena de executivos mulheres, negros e de empresas do nordeste conseguem capital. Uma característica do Black Founders Fund é que eles entenderam a minha jornada e estenderam a mão, foi uma conversa diferente das que eu tive com outros investidores”, comentou Tenório, que é de Maceió, capital do Alagoas.
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Para o TrazFavela, serviço de delivery que atende as áreas periféricas de Salvador, e que foi um dos primeiros selecionados, o valor investido está sendo usado, principalmente, para desenvolver um aplicativo para celular. Hoje, a empresa funciona por meio do WhatsApp.
“A gente começou um processo de mentorias e cursos sobre ferramentas do Google. Hoje interagimos com um dos integrantes da rede do Google que nos mentora, conversamos com participantes de outros programas do Google for Startups, com uma troca de conhecimento”, disse Iago Santos, cofundador do TrazFavela.
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