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Crise foi desigual e dividiu 'vencedores' e 'perdedores' durante a pandemia


Impacto fez com que alguns setores caíssem muito acima da média e outros prosperassem no ano de maior queda da economia brasileira. Serviços de entregas cresceram durante a pandemia
Marcelo Brandt/G1
A característica mais marcante da crise do coronavírus foi seu impacto desigual sobre diferentes setores da economia.
Na queda histórica de 4,1% no PIB de 2020, divulgada nesta quarta-feira (3) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há grupos de vencedores, que prosperaram mesmo em ambiente inóspito, e outros perdedores, que foram prejudicados muito além da média.
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Claro que, evidentemente, a maior parte da economia tomou um golpe nunca antes visto. Mas as histórias de Daniela Teles e Aarão Ruben exemplificam bem essa disparidade em setores localizados.
Ela, motorista de aplicativo de transporte, batalhou, corrida a corrida, com a queda de atividade em meio a uma frota de 120 mil de veículos em São Paulo. Ele, um empresário do setor de construção, foi beneficiado pela injeção de demanda por meio de programas de distribuição de renda, como o Auxílio Emergencial.
Conheça as trajetórias e saiba quais setores saíram-se bem e outros que foram pior que o esperado em meio à maior crise da história.
Crise sem precedentes
Daniela Teles foi motorista de aplicativo por quatro anos, mas precisou devolver o carro à locadora por não conseguir pagar as prestações.
Arquivo pessoal
Aos 37 anos, Daniela foi motorista de aplicativo por quatro anos. Sempre preferiu as madrugadas, sem trânsito, para atender jovens que saiam de bares e baladas de São Paulo. Trabalhava, em média, 10 horas por dia e conseguia fazer R$ 330 em um turno.
Veio a crise. A noite paulistana foi a nocaute e seu público minguou. Ela chegou a suspender as atividades por um tempo, pois mora com a mãe, que é do grupo de risco mais ameaçado pela Covid-19. Na hora de voltar ao trabalho, a solução foi transferir a jornada para atender o público diurno. Mas escritórios estavam vazios, eventos e reuniões também haviam deixado de acontecer.
“O que segurou bastante foi o transporte de profissionais da saúde. Mesmo assim, o faturamento caiu 70%”, diz Daniela.
Um agravante: o carro não era próprio. A conta da locadora de veículos é debitada direto do faturamento repassado pelo app de transporte. Quando a motorista deixou de trabalhar, foram gerados boletos. A dívida chegou a R$ 2 mil.
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Como o dinheiro não sobrava, no início de setembro o carro foi pedido de volta pela locadora. Daniela chegou a dividir o carro com uma amiga para quitar os pagamentos atrasados, prática que as plataformas de transporte não permitem. Ela conseguiu o dinheiro para zerar a dívida, mas foi negativada no cadastro da locadora. Não conseguiu alugar outro veículo.
Desde janeiro, Daniela trabalha como assessora parlamentar na Câmara dos Vereadores de São Paulo, dando apoio ao vereador Marlon Luz — eleito pela categoria de motoristas de aplicativo — e trabalha trazendo demandas da base eleitoral para o gabinete.
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Perdedores da crise
19 de maio – Homem olha para o telefone no saguão vazio do Aeroporto Internacional de Guarulhos, em meio ao surto de coronavírus (COVID-19), em Guarulhos, São Paulo
Amanda Perobelli/Reuters
Na ponta mais sofrida da economia, está o setor de serviços, da qual Daniela faz parte. Atividades como transporte aéreo, hotelaria, bares, restaurantes e tantos outros amargaram as consequências mais graves da necessidade de reduzir a circulação para contenção do coronavírus.
Ainda que parte desses serviços tenha sido sustentada pela digitalização (caso do delivery de comida), o faturamento dessas atividades não chegou a compensar as perdas com a falta de público in loco.
Mas as quedas bruscas não ficaram restritas aos serviços. Setores do comércio que dependem da circulação também penaram para repor os gastos recorrentes.
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Lojas fecharam as portas em São Paulo durante a crise
Marcelo Brandt/G1
Um exemplo foi a performance do setor de vestuário e calçados. Na Pesquisa Mensal do Comércio do IBGE, a queda foi de 22,7% em 2020. E é um cenário que se espalha para a indústria. Confecção de artigos do vestuário e acessórios teve queda de 23,8% na Pesquisa Industrial Mensal.
Outro segmento do comércio que impacta na indústria por conta do afastamento: as papelarias. Com a interrupção nas aulas escolares, “Revistas e papelaria” tiveram queda de 30,6% na PMS e “Impressão e reprodução de gravações” caiu 38% na PIM, entre outros segmentos da cadeia.
Ganhos na crise
Aarão Ruben teve alta de 17,5% no faturamento em sua loja de material de construção, mas inflação e investimentos apertaram a margem de lucro.
Arquivo pessoal
Aarão Ruben é dono de uma loja de material de construção em Guarulhos, na Grande São Paulo. Na contramão do PIB do país, o setor foi um dos que mais prosperaram durante a crise do coronavírus. Segundo a Pesquisa Mensal do Comércio, do IBGE, o setor teve 10,8% de alta em 2020.
São dois principais motivos: as restrições de deslocamento, fechamento de bases de trabalho e o aperto da cesta de consumo anteciparam o apetite por fazer melhorias em casa ou nas empresas que, até então, adiavam reparos necessários. A injeção de recursos por meio do Auxílio Emergencial e outros benefícios sociais também deu orçamento extra para esses restauros.
“O Auxílio Emergencial fez muita diferença, mas a demanda era tanta que causou desabastecimento. Alguns itens da construção civil, como ferro, tiveram aumento de mais de 100%. Eu pagava R$ 53 em uma tela para concretagem, hoje está R$ 160”, diz Ruben.
Entre outros itens, o empresário cita também altas em tubos de PVC, e itens que dependem de resina, papelão etc. “Sumia do mercado e voltava sempre com aumentos”, afirma. Boa parte desse efeito está presente na inflação ao produtor, medida pelo Índice de Preços por Atacado (IPA).
Com peso de 60% na composição do IGP-M, o indicador subiu 3,28% em fevereiro. O minério de ferro, para ficar apenas no exemplo citado pelo empresário paulista, teve a maior influência no resultado, com alta de 22,87%.
Resultado da equação é que a loja teve alta de 17,5% em faturamento, mas conquistou crescimento líquido de cerca de 2%. A saída das mercadorias, portanto, ainda não compensou o avanço dos preços e formação do estoque.
“Precisei investir em transporte e fazer contratações, pois estava vendendo mais. Mesmo sem colher tudo ainda, quanto mais animado é o mercado, mais se pode expandir e ampliar seu mercado”, afirma o empresário.
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Vencedores da crise
Novo centro de distribuição do grupo Dafiti, inaugurado em fevereiro em Extrema (MG).
Divulgação/Dafiti Group
As sondagens mensais do IBGE também dão pistas de quem se saiu bem mesmo com a pandemia em curso.
Dentre os poucos vencedores do setor de serviços, estão as atividades de Tecnologia da Informação (8,3%). No comércio, a venda de móveis e eletrodomésticos se destaca (10,6%). Ambos fazem a fórmula do home office – que teve enorme expansão para quem tem empregos mais qualificados e que dispensam o contato físico.
Com o fechamento de comércio e dos serviços, também foram impulsionados segmentos que se beneficiam da maior parcela de tempo em casa. Na indústria, ganhou destaque a fabricação de produtos alimentícios (4,2%). No comércio, supermercados e hipermercados também cresceram com força (4,8%), junto com artigos farmacêuticos (8,3%).
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Por fim, como mostrou o G1 na semana passada, ganharam força os setores que estavam bem posicionados no universo digital. O aumento na demanda por conta da pandemia de coronavírus e também o maior número de empresas que decidiram entrar no comércio eletrônico fez o setor crescer, em vendas, um montante de 68% na comparação com 2019.
O e-commerce representava 5% do faturamento do varejo no final de 2019, mas alcançou um patamar acima de 10% em alguns meses do ano passado.
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