Empresas correm para desenvolver modelos de IA (inteligência artificial) mais potentes do que os atuais e, por isso, têm se antecipado na encomenda de chips de ponta da Nvidia. A espera chega a 210 dias (ou sete meses).
O cenário foi relatado por representantes de companhias envolvidas com sistemas de IA e confirmado pelo diretor da gigante da tecnologia para América Latina, Márcio Aguiar, em entrevista à Folha.
“Os resultados divulgados ontem ainda estão pequenos, o mercado de IA envolve mais de US$ 1 trilhão (R$ 4,9 trilhões)”, diz Aguiar.
A alta demanda pelas chamadas GPUs (unidades de processamento gráfico) fizeram o valor de mercado da Nvidia mais do que quadruplicar desde o lançamento do ChatGPT, em novembro de 2022.
Essa cobiçada peça chegou a ser vendida por mais de US$ 30 mil (cerca de R$ 147 mil) no varejo, por ser essencial para treinar plataformas de IA generativa em um tempo viável. Ao longo de 2023, houve em escassez na oferta do componente.
Nesta quarta-feira (21), a Nvidia divulgou balanço e registrou uma alta de 126% na receita em 2023, na comparação com 2022. Os números fizeram a empresa ultrapassar novamente Google e Amazon em valor de mercado e aproximaram a empresa da avaliação de US$ 2 trilhões (R$ 9,9 trilhões).
O Brasil representou no último trimestre 5% da receita global da desenvolvedora de chips, com US$ 1,1 bilhões (R$ 5,4 bilhões) gastos com a empresa. Essa parcela se limitava a 3,8% em 2022.
De acordo com Aguiar, a empresa investe para aumentar a produção e criar GPUs. Dedicou US$ 2,9 bilhões (R$ 14,3 bilhões) a nova planta da fabricante de chips TSMC, que tira os projetos da Nvidia do papel.
Além disso, em 2021, desenvolveu um software que acelera o processo de litografia dos chips —processo que dá forma aos circuitos eletrônicos das GPUs.
Ainda assim, o chefe-executivo da Nvidia, Jensen Huang, disse em anúncio a investidores que a expectativa de que a Nvidia atenda toda a demanda do mercado é irracional.
No balanço, a empresa projetou uma receita para o primeiro trimestre de 2024 de três vezes o registrado no mesmo período de 2023.
O setor de datacenters da Nvidia, que tem nas GPUs o seu principal elemento, representou 83% do dinheiro que entrou no caixa no último trimestre.
A fabricante de chips também fornece tecnologia para o setor automotivo, robótica e o chamado omniverse industrial —em que indústrias usam espaços de realidade virtual para fazer simulações.
Segundo Aguiar, a Nvidia deve anunciar GPUs mais avançadas em seu principal evento do ano, marcado para os dias 18 a 21 de março.
Quando o entusiasmo com IA explodiu no início do ano passado, as GPUs H100 protagonizaram uma caçada por parte dos empreendedores engajados na tecnologia. Em novembro, a Nvidia anunciou a H200, com mesma arquitetura, porém com mais potência.
A Nvidia controla hoje cerca de 80% do mercado de chips de ponta para IA, de acordo com a agência Reuters.
“Quando começamos, há 31 anos, havia 19 produtoras de chips, esse número foi se reduzindo porque nosso cliente confia em nós”, diz Aguiar.
A liderança da Nvidia desafia a concorrência, uma vez que desenvolver uma linha de GPUs requer gastos em torno de US$ 2 trilhões a US$ 3 trilhões (R$ 9,9 trilhões a R$ 14,8 trilhões), segundo o diretor da Nvidia. “Quando terminarem esse projeto em três anos, estaremos três gerações na frente.”
O avanço na capacidade de processamento de dados é essencial para criação de modelos de inteligência artificial ainda mais complexos. O processo de treinamento envolve quantidades massivas de dados, impossíveis de manipular há poucos anos em função de limites tecnológicos.
Em 8 de fevereiro, o Wall Street Journal noticiou que Sam Altman, o chefe-executivo por trás do ChatGPT, movia esforços para levantar até US$ 7 trilhões (R$ 34,6 trilhões) para reformular a produção de chips pelo mundo. Esse negócio, contudo, ainda se limita a um rumor.
Por enquanto, a Nvidia está no topo do segmento e, no início do mês, reportou participação em outras empresas do setor como Super Micro, Arm —protagonista da maior oferta pública inicial do ano passado—, Advanced Micro Devices e Marvell Technology. Os papéis de todas se valorizavam na tarde desta quarta, após a divulgação do resultado da Nvidia.
Outro movimento importante para a Nvidia foi a compra em 2019 por US$ 6,9 bilhões (R$ 34,1 bilhões) da empresa de redes computacionais Mellanox, o que deu a gigante da tecnologia vantagem na área de projetos de datacenters.
Assim, a empresa se tornou crucial para montar redes de GPUs procuradas pelos maiores provedores de nuvem do mundo: AWS, Microsoft e Google.
“Tivemos um investimento muito grande por parte dos provedores de nuvem, principalmente depois que a Microsoft anunciou o seu Copilot [assistente baseado em IA]”, afirma o diretor da Nvidia. No mundo todo, são mais de 50 mil corporações que utilizam essa tecnologia. “O Copilot roda 100% em arquiteturas de GPU da Nvidia.”
Aguiar afirma que a demanda na América Latina também cresceu, com empresas interessadas em colocar de pé os próprios serviços de IA, após frustrações com as alucinações de modelos generalistas como ChatGPT e Gemini, do Google. Para isso, a Nvidia tem a própria nuvem, chamada Nemo.