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Apple muda e opta por discrição ao lançar Vision Pro – 20/01/2024 – Tec

Quando a Apple lançou o Apple Watch em 2015, foi algo rotineiro para uma empresa cujas atualizações do iPhone se tornaram marcos culturais. Antes de o relógio ser colocado à venda, a Apple deu modelos antecipados a celebridades como Beyoncé, apresentou-o em publicações de moda como a Vogue e transmitiu um evento chamativo na internet destacando seus recursos.

Mas, enquanto a Apple se prepara para vender sua próxima geração de dispositivos vestíveis, o Vision Pro, um dispositivo de realidade aumentada, ela está entrando no mercado de consumo de forma muito mais discreta.

A empresa afirmou em um comunicado de imprensa neste mês que as vendas do dispositivo começariam nessa sexta-feira (19). Nenhum grande evento de lançamento foi agendado, embora a Apple tenha criado um comercial cativante sobre o dispositivo e oferecido demonstrações individuais a revisores de tecnologia. E, em uma mudança para a empresa secreta, o Vision Pro foi testado com mais desenvolvedores do que os produtos anteriores da Apple para ver o que eles gostam e não dele.

A redução das estratégias de marketing reflete os desafios enfrentados pela Apple, uma empresa que cresceu tanto ao longo dos anos que novas linhas de produtos que poderiam valer bilhões ainda são uma pequena parte das vendas do iPhone, que ultrapassaram US$ 200 bilhões (R$ 985,4 bilhões) no ano passado.

A abordagem discreta da Apple em relação ao Vision Pro também reflete os desafios associados à venda de um dispositivo que ainda pode levar anos para atrair consumidores em massa. Além de explicar o que o Vision Pro pode fazer —como faz com todo novo dispositivo— a Apple precisa superar seu alto preço de US$ 3.500 (R$ 17,24 mil), bem como o interesse limitado em gadgets de realidade aumentada que mesclam os mundos digital e físico. Outro desafio: a experiência tridimensional fornecida pelo dispositivo só pode ser realmente compreendida por meio de demonstrações.

A solução da Apple é avançar devagar e despertar o interesse dos desenvolvedores que podem criar aplicativos que funcionem com o Vision Pro. Espera-se que a empresa apresente o dispositivo a clientes habituais depois de reduzir o preço e aprimorar a tecnologia.

Os analistas esperam que a Apple venda cerca de 400 mil unidades do Vision Pro neste ano. Em comparação, a companhia vendeu aproximadamente 12 milhões de Apple Watches em 2015, segundo os analistas.

“A Apple sabe que este produto não está pronto para as massas”, disse Gene Munster, sócio-gerente da Deepwater Asset Management, uma empresa de investimento e pesquisa em tecnologia. “Para eles, fazer um grande lançamento seria fora de propósito”.

A Apple se recusou a comentar.

O investimento nos óculos

O Vision Pro levou quase uma década para ser desenvolvido e custou bilhões de dólares. O dispositivo, que se parece com óculos de esqui, usa câmeras e sensores para rastrear os olhos e os movimentos das mãos das pessoas enquanto elas interagem na tela do headset com objetos digitais em 3D, como aplicativos e telas de computador. Ele também pode gravar vídeos em 3D e reproduzir filmes em telas que parecem tão grandes quanto as de um cinema.

“É o primeiro produto da Apple pelo qual você olha através dele, e não para ele”, disse Tim Cook, CEO da Apple, em junho durante a apresentação do produto.

Mas os dispositivos de realidade aumentada têm lutado para conquistar os consumidores. No ano passado, a indústria de tecnologia vendeu 8,1 milhões de headsets de realidade aumentada, uma queda de 8,3% em relação ao ano anterior, segundo a IDC, uma empresa de pesquisa de mercado. Desde que entrou no mercado em 2014, a Meta, dona do Facebook, tem vendido headsets Oculus e Quest para videogame e reuniões virtuais. Sony, Microsoft e Varjo, uma empresa finlandesa, também possuem dispositivos de realidade aumentada.

A Apple tentou diferenciar seu dispositivo dos concorrentes que descreveram seus produtos como portais para o metaverso. Em vez de usar esse termo, cunhado por Neal Stephenson no romance “Snow Crash” de 1992, a Apple chamou sua experiência de realidade aumentada de “computação espacial”.

Em suas diretrizes para headsets, a Apple pediu aos desenvolvedores que não se referissem aos aplicativos que criam como produtos de realidade virtual ou aumentada, mas como aplicativos de computação espacial.

“Eles estão mantendo o controle completo”, disse Grant Anderson, CEO da Mirrorscape, fabricante de um aplicativo de realidade aumentada para jogos de tabuleiro.

Desde a revelação em junho, a Apple tem cortejado desenvolvedores que esperam que sejam construídos aplicativos para o dispositivo. Ela criou laboratórios de teste ao redor do mundo onde os desenvolvedores podem experimentar o produto.

Ouvindo quem testou

Em agosto, Cristian Díaz, engenheiro da Monstarlab, foi a um laboratório do Vision Pro, em Munique, na Alemanha. Depois de passar por uma porta secreta com o logotipo da Apple, ele se juntou a vários outros desenvolvedores que foram equipados com um headset e tiveram seis horas para testar seus aplicativos e escrever código no sistema.

Díaz disse que os engenheiros da Apple pediram feedback aos desenvolvedores sobre o dispositivo, incluindo como o software e as ferramentas de desenvolvimento funcionavam. Eles anotaram. Quando Díaz voltou para uma segunda experiência de laboratório em Londres em setembro, ele disse que ficou claro que a Apple fez melhorias com base em sua avaliação.

Entre as mudanças, a Apple viabilizou que seus engenheiros observassem o que os desenvolvedores estavam fazendo dentro dos headsets, conectando-se a eles com a ferramenta de comunicação sem fio da Apple, o AirPlay, disse Díaz. Isso permitiu que os engenheiros ajudassem os desenvolvedores a resolver problemas enquanto trabalhavam em seus aplicativos.

“Éramos como animais em um laboratório”, recordou Díaz, que chamou o Vision Pro de “uma ótima experiência”.

As diferenças entre Jobs e Cook

A abordagem foi algo diferente para a Apple. Sob seu cofundador Steve Jobs, a empresa evitava em grande parte fazer grupos de foco para seus produtos porque ele acreditava que o trabalho da Apple era descobrir o que os clientes queriam antes que eles soubessem.

Cook tem sido mais aberto a buscar feedback, disse Phillip Shoemaker, que trabalhou na Apple por sete anos, liderando sua App Store. Tanto sob Jobs quanto Cook, a Apple testou seus produtos iPad e Watch com desenvolvedores selecionados em Cupertino, na Califórnia (EUA). Mas com o Vision Pro, a companhia levou um produto não-lançado para desenvolvedores no exterior pela primeira vez.

“De todos os produtos para fazer isso, um headset faz sentido porque um headset é complicado”, afirmou Shoemaker, diretor executivo da Identity.com, uma organização sem fins lucrativos de verificação de identidade. “Eles não se encaixam bem em todos.”

Além de atrair desenvolvedores, a Apple trabalhou com empresas de entretenimento para equipar o Vision Pro com programas de TV, filmes, música e esportes. A Disney tornou possível assistir a filmes de um cinema em seu aplicativo de streaming no dispositivo, e a cantora Alicia Keys gravou uma performance em um vídeo imersivo em 3D.

Experiências de conteúdo serão essenciais para ampliar o apelo do dispositivo, avaliou Carolina Milanesi, analista de tecnologia da Creative Strategies. Porque os headsets isolam as pessoas do mundo, ela disse, a Apple terá que dar às pessoas motivos para passar tempo em um.

Para despertar o interesse dos consumidores, a Apple tem veiculado um comercial nas emissoras de TV dos EUA. O comercial mostra trechos de filmes famosos com pessoas usando headsets, incluindo Luke Skywalker, de “Star Wars”, e Doc Brown, de “De Volta para o Futuro”. Ele culmina com uma mulher colocando um Vision Pro.

O anúncio é uma lembrança do comercial original do iPhone que mostrava trechos de TV e filmes de pessoas atendendo o telefone, como Lucille Ball em “I Love Lucy”.

A Apple tem veiculado um anúncio do Vision Pro durante os jogos da NFL (liga de futebol americano), de acordo com o iSpot.tv, que mede os gastos com anúncios. A Apple gastou US$ 6,4 milhões no comercial durante a segunda semana de janeiro. Em comparação, ela gastou US$ 9,3 milhões em um anúncio do iPhone na primeira semana após o lançamento do iPhone 15 em setembro passado.

“É um produto que será ubíquo? Não”, disse Milanesi. “Será um produto que levará tempo.”

Visto primeiro na Folha de São Paulo

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